À primeira vista, são um sonho tornado realidade para qualquer família atarefada. Basta atirar os ingredientes para dentro de um copo, carregar nuns botões e voilá: está feito o jantar. Infelizmente, não é bem assim. Utilizar uma máquina de cozinha requer quase sempre o mesmo tempo (ou até mais), que os processos tradicionais. E, para grande desilusão minha, continuamos a ter de descascar cebolas.

 

Contudo, estas máquinas que moem, pulverizam, picam, trituram, cortam, emulsionam, amassam, misturam, aquecem, fervem, refogam, salteiam e cozem a vapor são muito cobiçadas. Em Portugal já foram vendidas 225 mil Bimbys e centenas de vendedores fecham, todos os dias, novos negócios. Mas o longo reinado da máquina da empresa alemã Vorwerk, que teve início em 1970, poderá estar a chegar ao fim. Depois de surgirem máquinas concorrentes, como a da Taurus, a Vorwerk instaurou processos judiciais em vários países, por violação de patentes. Contudo, o último caso, julgado este ano em Espanha, foi desfavorável à marca germânica: os juízes entenderam que, 40 anos depois, as suas inovações podem ser utilizadas por outros fabricantes. Digamos que, um pouco como sucede no mundo farmacêutico, já é permitido produzir genéricos.

 

E aí estão eles, entrando em força no mercado português: depois do lançamento da Yammi, do Continente, na semana passada, até final de outubro está prometida a chegada da Chef Express, do Pingo Doce.

 

Se a vida te dá limões...

Poderá uma máquina que custa um terço da líder de mercado fazer o mesmo que a original? Eis o desafio que tenho sobre a mesa da cozinha. De um lado, a Bimby: mais pesada e robusta, tecnologicamente avançada, com um design apelativo. Do outro, a Yammi: mais leve e comprida, com um painel simplificado de funções e materiais mais modestos.

 

Parecem diferentes mas um olhar mais atento descobre as semelhanças: os acessórios da Yammi (lâminas, espátulas, etc.) são cópias exatas dos da Bimby e até as receitas dos seus livros parecem passadas a papel químico.

 

Comecei por ligar a máquina da Vorwerk para fazer a famosa limonada que as vendedoras da marca apregoam como "a melhor do mundo". O livro de instruções diz que basta colocar dois limões, 100 gramas de açúcar e um litro de água no copo e ligar a máquina apenas por um segundo... Desconfio mas, de facto, foi o que bastou para os frutos ficarem desfeitos. Cuidado com esta lâmina, é só o que vos digo.

 

A limonada é realmente boa (e melhor ficou com um pouco de hortelã). Avanço para uma sopa de tomate com feijão-verde e ovos escalfados, o que obriga à montagem dos tabuleiros da cozinha a vapor. Tudo funciona bem e as instruções são fáceis de seguir mas o processo demora 45 minutos... Começo a perder energia para lavar todas as peças e cozinhar outro prato. Opto, por isso, por fazer uma massa de pizza (só 5 minutos) e, enquanto a deixo levedar, confeciono um doce que fica sempre bem no frigorífico: lemon curd.

 

O ponto deste doce de origem britânica é delicado e a Bimby passa no teste com distinção, misturando os ingredientes com a necessária gentileza.

 

Se nunca cozinharam numa Bimby, notem bem o que implica seguir uma receita:

Lemon Curd

Ingredientes: 160 g açúcar, 2 limões, 60 g manteiga, 2 ovos

Coloque no copo o açúcar e pulverize 20 seg/vel 9.

Junte as cascas de limão, só a parte amarela, e rale 15 seg/vel 9.

Adicione a manteiga, o sumo dos limões e programe 1 min/vel 2.

Junte os ovos e misture 10 seg/vel 4.

De seguida programe 7 min/80ºC/vel 2.

Confesso que tanto pára e arranca durante as receitas não me agrada. Mas é com este tipo de instruções precisas que estas máquinas transformam qualquer nabo num cozinheiro (o mérito, contudo, passa a ser do robô, não vale puxar pelos galões).

 

Mãos na massa

Está na hora de testar a Yammi e opto por cozinhar uma sopa de favas com coentros, ansiando pela textura aveludada de que os fãs destas máquinas tanto falam. Mas, embora duplique o tempo de trituração sugerido, subsistem pedaços da casca daqueles legumes em cada colherada (sucedeu o mesmo com sopa de tomate, cozinhada na Bimby). Nada que um velhinho coador não resolva. Tento, depois, que a máquina se redima, criando algo que persigo há anos, sem sucesso: a massa perfeita para rissóis. Quem já tenha andado às voltas com uma bola de farinha e água dentro de um tacho sabe como é uma tarefa penosa. Já para não falar nas horas de pancada que a massa exige, para que fique elástica e tenra. O livro de receitas promete-me este Graal da cozinha portuguesa em 5 minutos. Blasfémia?

 

A Bimby tem uma função específica para esta tarefa (o modo Espiga), que não existe na Yammi. A diferença é visível, no final da confeção: no copo da máquina alemã tenho uma bola uniforme; na versão chinesa, uma mistela esfarelada (isto sucede, porque a lâmina que mistura os ingredientes corta-os em vez de os amassar). Contudo, depois de moldadas com as mãos e estendidas com um tradicional rolo da massa, ambas ficam com o mesmo aspeto.

 

O teste final virá a seguir. Depois de recheados com pescada, passo os rissóis por ovo e pão ralado e largo-os, com expectativa, no óleo fervente.

À primeira dentada (versão Bimby), viajei no tempo. Era este o sabor dos rissóis da minha infância. À segunda (versão Yammi), comprovei o que já antecipava: empate técnico. As duas massas ficaram deliciosas. Foi nesse momento que eu, eterna resistente à entrada destas máquinas na cozinha, revi a minha posição: sim, seria capaz de me habituar a isto.

 

Mas qual escolher? A resposta não é simples. Equipará-las é tão injusto como comparar um carro topo de gama com um utilitário. Basta notar que a Bimby tem excentricidades como uma "caixa negra" que, tal como sucede nos aviões, regista todos os movimentos efetuados, para um correto diagnóstico, em caso de avaria...

 

Se ignorarmos o preço, a Bimby é superior. Mas, em última análise, só quem compra saberá que voltas precisa de dar na sua cozinha.

 

Como foi realizado o teste

A jornalista utilizou máquinas de cozinha cedidas pelas marcas, durante uma semana, sem que existissem contrapartidas editoriais ou comerciais pela realização deste teste comparativo. A Bimby não se vende em lojas e o aconselhamento personalizado, em casa do cliente, é um dos seus pontos fortes. A Yammi compra-se no supermercado, sem outras explicações além das impressas no manual de instruções. A VISÃO solicitou, por isso, que a Bimby fosse entregue sem a demonstração usual, para garantir igualdade de tratamento entre as marcas. Foram realizadas receitas semelhantes nas duas máquinas.